sábado, 2 de março de 2013

ILHA


Almadilha

Chegar à ilha,
Chegar na ilha



No chegar à ilha,
arma-se e armamos a armadilha da ilusão – a ilusão de fragilidade, fruto, talvez, da instabilidade do campo de visão durante o ondular do barco enquanto nós à ilha nos aproximamos; ou talvez da pequeneza, da aridez, da precariedade posta a nu.



Armadilha: a sensação de nudez nobre e nítida do castanho e azul duma paisagem despida e de costelas orgulhosas mas que teimamos em ver vulneráveis, quiçá por serem tão expostas ao olhar. Armadilha, pois o que se afigura aos que a ela aportam como frágil porque estranho e estrangeiro, porque destilador do precário, não é senão o ressoar da precariedade da vida e de vidas, do chão e de chãos, na alma do eu habituado a mundos mais amorfos e que, por isso mesmo, não obrigam à apreensão cabal da sua poética inteira para serem aceites como completos e familiares.



O chegar na ilha, porém,
é o dar-se conta da inteireza do mundo delineado e delimitado pela brusca e às vezes (aos lugares) violenta fronteira entre terra e mar – uma fronteira que vê guerra mas nunca a ocupação dum pelo outro, que é instável mas não frágil, e sim tão sólida e rígida quanto a divisa entre céu e solo, entre pele e ar. O dar-se conta da inteireza dum mundo cuja ideia de si, na realidade e no imaginário, cuja língua, cujo sotaque, cuja identidade é delimitada pela mesma fronteira violenta e prenhe de conflitos mas no entanto absoluta e excludente entre mar e terra, o litoral literal e figurativo.

Jeff Hassney



A viagem de Bento Oliveira que ocupará a Gare do Porto Grande do Mindelo 

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